Precarização do Trabalho

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TRABALHO E PRECARIZAÇÃO NUMA ORDEM NEOLIBERAL

Ricardo Antunes✱


[...] O capitalismo contemporâneo, com a configuração que vem assumindo nas últimas décadas, acentuou sua lógica destrutiva. Num contexto de crise estrutural do capital, desenham-se algumas tendências, que podem assim ser resumidas:

1) o padrão produtivo taylorista e fordista vem sendo crescentemente substituído ou alterado pelas formas produtivas flexibilizadas e desregulamentadas, das quais a chamada acumulação flexível e o modelo japonês ou toyotismo são exemplos; 

2) o modelo de regulação social-democrático, que deu sustentação ao chamado estado de bem-estar social, em vários países centrais, vem também sendo solapado pela (des)regulação neoliberal, privatizante e antissocial. 

Pelo próprio sentido que conduz estas tendências (que, em verdade, constituem-se em respostas do capital à sua própria crise), acentuam-se os elementos destrutivos que presidem a lógica do capital. Quanto mais aumentam a competitividade e a concorrência intercapitais, interempresas e interpotências políticas do capital, mais nefastas são suas consequências. 

Duas manifestações são mais virulentas e graves: a destruição e/ou precarização, sem paralelos em toda era moderna, da força humana que trabalha e a degradação crescente, na relação metabólica entre homem e natureza, conduzida pela lógica voltada prioritariamente para a produção de mercadorias que destroem o meio ambiente. 

Trata-se, portanto, de uma aguda destrutividade, que no fundo é a expressão mais profunda da crise estrutural que assola a (des)sociabilização contemporânea: destrói-se força humana que trabalha; destroçam-se os direitos sociais; brutalizam-se enormes contingentes de homens e mulheres que vivem do trabalho; torna-se predatória a relação produção/ natureza, criando-se uma monumental “sociedade do descartável”, que joga fora tudo que serviu como “embalagem” para as mercadorias e o seu sistema, mantendo-se, entretanto, o circuito reprodutivo do capital.

Neste cenário, caracterizado por um tripé que domina o mundo (com os Estados Unidos da América e o seu Nafta, a Alemanha à frente da Europa unificada e o Japão liderando os demais países asiáticos), quanto mais um dos polos da tríade se fortalece, mais os outros se ressentem e se debilitam. Por isso a crise frequentemente muda de centro, ainda que ela esteja presente em vários pontos, assumindo mesmo uma dimensão mundial. 

No embate cotidiano que empreendem para se expandir pelas partes do mundo que interessam e também para coadministrar as suas situações mais explosivas, em suma, para disputar e ao mesmo tempo gerenciar as crises, acabam por acarretar ainda mais destruição e precarização. A América Latina se “integra” à chamada mundialização destruindo-se socialmente. Na Ásia, a enorme expansão se dá às custas de uma brutal superexploração do trabalho, de que as recentes greves dos trabalhadores da Coreia do Sul, em 1997/8, são firme denúncia. Superexploração que atinge profundamente mulheres e crianças. 

É preciso que se diga de forma clara: desregulamentação, flexibilização, terceirização, bem como todo esse receituário que se esparrama pelo “mundo empresarial”, são expressões de uma lógica societal onde o capital vale e a força humana de trabalho só conta enquanto parcela imprescindível para a reprodução deste mesmo capital. Isso porque o capital é incapaz de realizar sua autovalorização sem utilizar-se do trabalho humano. Pode diminuir o trabalho vivo, mas não eliminá-lo. Pode precarizá-lo e desempregar parcelas imensas, mas não pode extingui-lo. 

Ricardo Antunes é Professor titular de Sociologia do Trabalho na Universidade Estadual de Campinas. O texto destacado faz parte do capítulo 2 – “Trabalho e precarização numa ordem neoliberal” (p. 37-38) da obra: A cidadania negada: Políticas de exclusão na educação e no trabalho, organizado por Pablo Gentilli e Gaudêncio Frigotto. São Paulo: Cortez, 2001, p.35-48


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