Filosofia e Educação: díade entre a práxis e emancipação

 Vinícius Tadeu de Almeida [1]





Resumo:
Presente artigo pretende elucidar a relação ente as respectivas áreas do conhecimento e potencial formativo humano: Educação e Filosofia, tendo em vista a sua Emancipação. Para este fim, será utilizado como princípio, os aspectos políticos do homem contemporâneo e sua intervenção no fazer pedagógico.
Palavras-chave: Filosofia. Educação. Emancipação.
Abstract:
This article aims to elucidate the relationship between the respective areas of knowledge and potential human training: education and Philosophy, with a view to their emancipation. For this purpose, will be used as the principle, the political aspects of contemporary man and his speech on education.
Keywords:   Philosophy. Education. Emancipation.

Introdução

Educação e Filosofia, uma díade do processo formativo humano, materializada na práxis, em virtude da sua própria emancipação. Como uma contínua apuração da ação-reflexão-ação, do âmbito individual e identitário cultural de sujeitos conscientes, justos e livres à vida social. 

Pressuposto isto, atentemos que o processo emancipatório humano compreende a articulação entre a teoria e prática. Esta exerce o papel social da Filosofia, isto é, ação política. E, primeira, o meio o qual o homem se potencializa, se elabora e se desenvolve. 
 Contudo, há o que se indagar:  1). Que metodologias ou teorias pedagógicas, enquanto educadores, estamos utilizando para formar homens justos, livres e autônomos, em uma sociedade capitalista e multicultural?  2). Enquanto educadores, somos justos, livres e autônomos?  3). Há unidade entre Teoria e Prática enquanto emancipação?
Questionamentos que nos conduzem aos aspectos epistemológicos, culturais, históricos e políticos. Neste intuito, buscaremos fazermos algumas primeiras incursões. Para efeito de dialogarmos, sem conclusões determinantes.  Pois, faze-nos sujeitos hábeis de observar, comparar, avaliar, escolher, decidir, intervir, romper, optar em sermos éticos e/ou a probabilidade de transgredirmos o nosso ethos.
 Visto como, os aspectos circundantes ao tema são complexos e possuem diversas bifurcações, fundamentaremos enquanto discurso na concepção filosófica (não) convergentes de Theodor Adorno, bem como os pensadores da educação. Dividimos o artigo em duas partes:  1) Educação e Filosofia: Teoria e Prática; 2) Educação e Filosofia: Aspectos Políticos.

Educação e Filosofia: Teoria e Prática

No processo educativo há sempre uma tensão na proposta daquilo que ensinamos como unidade teoria e prática. Segundo Adorno, isto seria um falso problema, pois, a teoria é gerada pela práxis, portanto, não é uma questão de unidade, mas é recomenda como um exercício crítico da polaridade genérica e pressuposto da teoria e orientação para práxis.
Uma tarefa árdua, complexa e degradante ao poder manhoso da ideologia, da política massificante da lógica capitalista, do mercado de trabalho. Da hegemonia, enquanto restruturação de produção, em que o homem contemporâneo é visto como seres consumidores tanto de conhecimentos objetivos separados da teoria e de produtos necessários a pseudos-atividade,[2] à barbárie da restrição de sua essência: nossa julgada naturalidade, avessa a impassibilidade e desumanização.
No entanto, como sabemos, o educador, a escola e o filósofo, tem sentido sua liberdade asfixiada ou castrada por meios de sistemas de ensino, decretos políticos, nos quais, são delimitados de forma fragmentada o conteúdo a ser refletido, autoestima comprometida, salários cada vez menores para uma carga horária de trabalho ampliada, entre tantos outros elementos característicos:


[...]. No campo da educação compete à filosofia proporcionar uma abordagem do real distinta das esquematizações sociológicas ou psicológicas, analisando a realidade sem intenção de repeti-la. Seu objeto é interpretar o mundo, estudá-lo de maneira a desvelar seus motivos diretores, suas linhas de movimento, suas contradições e seus sentidos (des) humanos. Mas seu objetivo é também transformar o mundo no contexto de seu oficio.  (Goergen, 2011, p. 146). Grifo meu.


Neste contexto, o educador justo não pode negar-se ao dever da sua prática, o reforço a capacidade crítica do educando e de si, sua curiosidade e sua insubmissão, assinalando posturas, comportamento e reflexão, tanto em debates profundos, como saída e resistência da condição de apenas sobrevivência (FREIRE, 2001, p.28). Pressuposto que a Filosofia se constituem com uma necessidade humana básica na medida em que precisa lidar de maneira inteligente com os desafios e conflitos/angústias impostos pela vida contemporânea, o homem necessita de formar-se entre os significados e sentidos do viver.

[...]. Refletir criticamente sobre as características da vida moderna, seu ritmo mecânicos e desumanos, seus conflitos e desesperos, cotejando-os como os verdadeiros alicerces do homem de hoje, é a contribuição da filosofia para a estrutura, ideais e performances da prática educativa. Se a educação se revela inadequada, se ela se encontra em crise, é hora de repensar sua relação com o humano no contexto de um mundo complexo de necessidade e desejos em que convivem, lado a lado, tragédia e felicidade, idealismo e pragmatismo, vida e morte, sonho e desilusão, fartura e fome. (Goergen, 2011, p. 138-139). Grifo meu.


Verificaremos em diante, como projeto político e seus discursos podem tanto pressupor uma negação da emancipação quanto poder ser ferramenta da humanização.

Educação e Filosofia: Aspectos políticos

No Brasil, as intervenções políticas na Educação, tanto por meios dos discursos e leis em tramitação vem abrindo lacunas e distanciando-se de uma educação emancipatória. Entre elas, pode-se citar PLS 193/2016[3], “Escola Sem Partido”, a grosso modo, tem como objetivo prevenir à prática da doutrinação política e ideológica nas escolas (PLS 193/2016, p.05).
Há que perguntar-se: o que está se entendendo por doutrinação, por política e por ideologia? A própria ação política não possui aspectos ideológicos?  Suponho, que a representação mimética da Educação para o Estado, é assegurada pelos quem o impelem, ou seja, deter ao seu poder a classe dominada harmoniosante, pela ordem e progresso.
 Por isso, a Educação para a autonomia, para emancipação, pela reflexão crítica, formativa de dimensões de resistência do indivíduo, precisa–se mais do que nunca a ser aplicada, ou seja, na práxisPois, (...) estão ameaçados de danos maiores por parte do espírito deformado e inculto”, que está à frente deles (ADORNO, 1995, p.53).
Por outro lado, é intrigante quando artigo 2º A Educação nacional atenderá aos seguintes princípios: III - Liberdade de aprender e ensinar; VI – Educação e informação do estudante quanto aos direitos compreendidos como liberdade de consciência e crença. Uma confusão de termos e ideias, ora reprime a ação docente e ora amenizar, e contraditórios, principalmente no terceiro.
Porque liberdade de aprender e ensinar significar não moldar ou adaptar os alunos e tampouco se resume a mera transmissão de conteúdo ou mesmo há exclusividade dos mesmos ou negação de outros, bem como as teorias pedagógicas, filosóficas, sociológicas (negação do marxismo, correntes e   pensadores derivados) considerados enquadrados por alguns cidadãos, políticos e idealistas, na ambígua forma de fascismo e comunistas.
A liberdade de aprender e ensinar não supõe o acomodar ou adaptar qualquer tipo de liberdade em relação ao mundo que o educando e o educador possam ter, e, segundo, porque os próprios conteúdos devem ser criticamente pensados em todas as etapas do processo educativo, para que não se torne um mero aparato instrumental sem “sentido condicionados pelo aparelho conceitual antes que a percepção ocorra” (ADORNO, 1985, p.83).  Como observar a retirada de alguns aspectos negativos de História, por exemplo, dizer que não houve a escravidão no Brasil ou o coronelismo exercia a equidade entre os seus empregados.
    Segundo Adorno, esta sanção das ideias se restringi àquilo que é factual e por normas fortalece a coação social, subscrita por todo aquele que optou por uma profissão intelectual.  A educação, assim, ganha sentido quando atende à necessidade política de indivíduos coisificados, na contramão, do objetivo maior da Filosofia e Educação que é:

Expor aos estudantes os paradoxos e contradições do real, fomentar a consciência do erro de julgar-se esclarecido quando a verdade se é apenas escravo da realidade, das coisas, do fluxo, pode ser o caminho para autonomia. Significa livrá-los da ilusão de que o simples domínio dos conhecimentos e habilidades necessárias ao manejo técnico do real leva à emancipação (Goergen, 2011, p.145).


Vê-se, então, que há um distanciamento da pretensa práxis política radical, instauradora da superioridade natural e ideológica.  A Educação e a Filosofia nas mãos do valor capital tornar-se mecanismo de engrenagem do aparelho estatal, avançando convulsivamente a economia perdulária entre gastos e estagnação. 
Por isso, atentemos para os valores éticos e morais, ou seja, “como agir perante os outros” (Brasil, 2000 a, p.31), não bastando apenas decidir em termos de uma política nacional, o que é certo ou errado, pois, é antes de tudo uma necessidade de avaliação de contexto a qual estão sendo empregados. Por isso, é na práxis docente, o debate reflexivo-crítico com os alunos, sobre política, sociedade, poder e bem comum, a globalidade da política e sua centralidade, política e pessoa, para enfim, agir.
Na realidade política não se esgota a somente em leis ou a monopólios econômicos e do poder-autoritário, mas em última razão, ao respeito dos direitos humanos, a pluralidade de elementos complementares e a dinâmica do bem comum público, como um fator de coesão social, valorando as especificidades da humanidade em cada homem.


[...]. Em primeiro lugar, a própria organização do mundo em que vivemos e a ideologia dominante – hoje muito pouco parecida com uma determinada visão de mundo ou teoria -, ou seja, a organização do mundo converteu-se a si mesma imediatamente em sua própria ideologia. Ela exerce uma pressão tão imensa sobre as pessoas, que supera toda a educação. Seria efetivamente idealista no sentido ideológico se quiséssemos combater o conceito de emancipação sem levar em conta o peso imensurável do obscurecimento da consciência pelo existente. [...]. De um certo modo, emancipação significa o mesmo que conscientização, racionalidade. Mas a realidade sempre é simultaneamente uma comprovação da realidade, e esta envolve continuamente um movimento da adaptação.  (ADORNO,1995, p.143). Grifo meu.
 
Por isso, o homem pós-moderno necessita de representações de si, em mundos paralelos, como tecnologia, dependendo dela para sobreviver, no qual   reprimi seus medos, angústias e fracassos.
Por sua vez, o encontro e desencontros em educação política, educação emancipatória submete há dois critérios importantes autônomo para decidir e a responsabilidade com aquilo que digo, faço e comprometo, uma vez que, cada sujeito usa do seu pensar como ferramenta contra a irracionalidade e princípios e fins de uma política que nega direitos e a própria razão. 

Filosofia e Educação

A Filosofia no seu papel de assumir e propor novos rumos ao homem, construir consciência histórica e cultural, ou seja, o desenvolvimento de um plano ideológico nacional.  De tal modo, a concebermos a Filosofia como um pensamento autônomo e voltada para os sistemas filosóficos, sobretudo, os marxistas enquanto presença inspirada na dialética da práxis dos homens: saber ouvir e saber proferir, incorporada ao contexto cultural e da razão histórica da vida coletiva do povo.
O sentido do filosofar adquirido na História, não pode ser interligado pelas técnicas de erudição, mas pelo significado que lhe é conferido. O conhecimento histórico é o caminho teórico, as condições e conceitos históricos são como alicerce da reinterpretação da formação cultural, proporcionando o sentido da problemática em locus, referente ao agente político enquanto sujeito das práxis; rompendo com a fórmula própria de domínio de habilidades e conceitos e manejo técnico do real (GEORGEN, 2011).  
A discussão da importância do ensino da filosofia além da técnica e também direcionada para a leitura do mundo, como construção da emancipação por meio da crítica da realidade educacional e das interações dos sujeitos envolvidos na formação, professores, alunos e coordenadores pedagógicos (secretários educacionais), em que possam ansiar uma vida coletiva como a Escola e Faculdade mais justas e humanizadoras, repassada pela criatividade social ou práxis como um profundo conteúdo moral (VÁSQUEZ, 2003, p. 469). Pois, como um trabalho criador, a Filosofia é o ato ou conjunto de atos em virtude dos quais o sujeito ativo (agente) modifica uma matéria prima dada” (VÁSQUEZ, 1980/2007, p. 245).

[...]. Mas não se deve em esquecer que a chave da transformação decisiva reside na sociedade e em sua relação com a escola. Contudo, neste processo a escola não é apenas um objeto [...] apesar de todos os argumentos em contrário no plano das teorias sociais, é tão importante do ponto de vista da sociedade que a escola cumpra sua função, ajudando, que se conscientize do pesado legado de representações que carrega consigo. (ADORNO,1995, p.116).

Porquanto, mesmo que o espírito não compreenda a totalidade do real que a Filosofia pretende oferecer, ele é capaz de afiançar-se em todos os possíveis coeficientes do esclarecimento.  Um procedimento que torna cada vez mais a ser pesquisado para sobrepor às (con) fusões. Haja vista, que a Filosofia propicia a compreensão das condições históricas da inteligência e condições da sua liberdade.
Condições estas, produto de lutas, ideias, mecanismos econômicos-políticos de um povo em relação as demais culturas, como matizes da experiência e altamente significativos. Como um homem em ação e empenhado em orientar e fazer enxergar o passado e repensando-o. Assim, uma força produtiva que não exclui as restaurações com o aprendizado e a maturidade. 

Considerações Finais
Pelo exposto, Educação e Filosofia são em si demasiadamente áreas complexas e de diversas bifurcações, e impossível em si esgotá-las.  No entanto, há um abismo entre o que o feito e o que há por fazer, quando ambas áreas do conhecimento visam a emancipação de seres conscientes e autônomos, para o verdadeiro exercício da cidadania. Mesmo por que, sempre haverá a relação impactante de dominação frente o que detêm poder para controlar o que haverá de ser ensinado e com objetivos próprios.
Por isso, as metodologias e teorias educacionais e filosóficas, os educadores e filósofos, devem marcar em sua práxiso sentido que emerge do entretecimento da consciência individual como todo da sociedade, da natureza e da história” (GOERGEN, 2011, p.148).   Neste sentido, a Educação e Filosofia evoca sempre uma ação-reflexão-ação, como fecunda atividade ao destino do homem, um transito dialético assegurada na e para realidade.
Na concepção de Adorno, o sentido do ensino da Filosofia, contrapondo aos “artesãos” das ciências particulares e os convida a se dedicarem a formação filosófica e depois a suas artes específicas. Ele perpassa através do espírito filosófico desenvolvido, enquanto forma pura do saber.

Referências

ADORNO, Theodor; HORKHMEIMER. Max. Diáletica do Esclarecimento. Tradução Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Zahar, 1985.
ADORNO, Theodor.  Educação e Emancipação. Tradução Wolfganf Leo Maar. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1995.
BRASÍLIA. Assembleia Legislativa do Senado. Projeto de Lei nº 193, de 2016 que dispõe sobre entre as diretrizes e bases da educação nacional, de que trata a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, o "Programa Escola sem Partido".  Disponível em: < https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/125666>. Acesso em: 02/08/2016.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 2001

GOERGEN, P. L. Filosofia da Educação entre a integração e a emancipação. In: SEVERINO, A. J.; ALMEIDA, C. R. S.; LORIERI, M. A. (Org.) Perspectivas da Filosofia da Educação. São Paulo: Cortez, 2011.

VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Filosofia da Práxis. São Paulo: Editora Expressão Popular/Clacso, 2007.



[1] Professor de Filosofia da Secretaria Municipal de Educação de Baruerí/SP– Assessor Pedagógico Brasil Cultural Publicações, Mestre Educação: Formação de Educadores, profil.vinicius@gmail.com
Trabalho apresentado no Eixo Temático: Perspectivas filosóficas e políticas da Educação do I Congresso Internacional de Educação, realizado pelo PPGE da Universidade de Sorocaba, no Campus Cidade Universitária– Uniso – Sorocaba, SP, nos dias 24, 25 e 26 de outubro de 2016.
[2] Conceito utilizado por Adorno para referir-se as práticas que, embora, tenham características de autonomia, são instrumentalizadas parra reduzir o homem ao capital.
[3] Projeto de Lei do Senado, proposto pelo senador Magno Malta. Inclui entre as diretrizes e bases da educação nacional, de que trata a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, o "Programa Escola sem Partido".

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